quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Feito eu, escrevendo tanto pra tão pouco

Feito coisa ruim
coisa feita para me desgraçar
feito o absurdo
que é anunciar
tal desejo antológico
por quem nem me lê
talvez já tenha lido
e não gostado
feito praga
mau agouro
feito para caber
nas coisas que jamais terei
feito homem formoso que é
e não seria se me quisesse
feito a dor cantada
de Édith Piaf
feito a vulgaridade excitante
de Bukowski
feito eu encerrando
esse poema com Hilst
feito docilidade tua
eu tua inteira
Feito você
não fazendo nada
e me deixando
sem eira, nem beira.

domingo, 24 de janeiro de 2016

Não magoe o poema

   Não consigo vislumbrar acontecimentos grandiosos acerca disso. Eu retiro novos fragmentos do que parece nunca ter acontecido, vivo na penumbra deste homem noturno. Você compreende? É um precipício com todas as letras do abecedário, eu me lanço sempre ao sem volta. Creio que alguém já tenha escrito isso, mas estar encantada é viver um plágio. 
   Dele eu não tenho nem educação, de mim ele dispõe de dezenas de poemas. Sou uma boa clariceana, o que não presta sempre me interessou muito. No mesmo instante de tempo em que ele parece ser o cara mais estonteante da avenida, também parece a futilidade em pessoa. Todos acham que estou me sabotando por algo bonito mas barato. Estou?


Diga-me, Dionísio.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Não cabe no infinito, e é fuga e vento

Você
Vende cores
Não é à toa que é o homem
mais colorido da cidade
Sua loja de tintas
é o contraste daquela rua
Suas cores
desobstruem minha escuridão
Dias cinzas não existem
quando vejo sua loja
vermelha - mesmo que de longe
Leia-me se for capaz,
deveria ter dito isso,
na última vez que o vi
Mas você parece ter medo
Eu morro de medo
As mãos que percorreram
seus ombros largos
São as mesmas que escrevem
essas palavras desencantadas
Quando me ver de novo
Me acaricia com seus olhos selvagens
e me põe o coração disparado
Como se fosse impossível
sentir isso por mais alguém
Seja meu Dionísio
Meu personagem
Meu Deus mitológico
Seja o homem
por quem valha a pena
escrever sobre
Seja mais do que esses olhos verdes
e dono do andar bonito
Seja o que eu penso,
mesmo que eu tenha
me enganado feio
Seja qualquer coisa além
da decoração daquele bar
Seja mais do que o cara
da loja das tintas
que parece um monumento
descansando na porta
Seja o amor drummondiano
que bate na aorta.


Título: Carlos Drummond de Andrade

domingo, 17 de janeiro de 2016

Respinga em mim seu carnaval

Eu sou bossa nova
e você samba
Sempre sambando
no meu coração
Respinga em mim seu carnaval
Diga algo agora,
não quero me desperdiçar mais
Sem disfarçar,
tenho pintado tudo de caos
Eu o aceito
mundano boêmio e conquistador
Me lambe
Me lambuza
Me usa de novo
E de novo
Me morde a face com zelo,
outra vez de novo
Emerja em mim
feito uma infecção.


16/01/2015

sábado, 9 de janeiro de 2016

Nos rastros dos meus pés, eu te levo em qualquer lugar

   As veias da cidade me encaminham para sua esquina, mas você nunca aparece. Vi na previsão que o Sol também não aparece hoje. Só preciso dizer-lhe que seu corpo naquele agosto, contornou a sinuosidade da minha alma. Se você passasse aqui agora, eu diria mais, que esbarrei com o Diabo no céu da sua boca e gostei. 
   Hoje por acaso todos os homens pueris dessa mesma cidade resolveram lembrar de mim, eu que só escrevo sobre você há cinco fatídicos meses. Eu posso cantar debaixo da sua janela verde tudo o que me falta escrever, eu também posso acampar na frente do seu trabalho, posso persegui-lo em todos os bares mais ínfimos, para vê-lo corrompendo outras moças deslumbradas. 
   Eu escrevinhadora de drama, escrevi seu nome na sola do meu sapato favorito, essa noite eu vou dançar até você se apagar de mim.