quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O meu íntimo ferve e não está quieto, os dias da aflição me surpreenderam

Aquela foi uma boa cena
Sua mão pousando sobre a minha
Eu contendo espasmos de sobriedade
Desejando que as horas
não se diluíssem na correnteza
Mas a fugacidade
sempre espera pela aurora
Você tocou na minha mão
E eu achei isso mais íntimo
que seu beijo na minha boca
Meu coração feito pandorga
voou e se enredou
nos galhos espinhosos das suas íris


Ajude-me, Senhor


Título: Jó 30-27

sábado, 26 de dezembro de 2015

Os girassóis continuam lá, se destacando entre os pastos verdejantes. Eu estou aqui, ainda comovida. E você, o que lhe faz chorar?

   Vai anoitecer e eu gostaria muito de escrever algo que valesse a pena, que valesse esse desespero. Algo como aquele conto do Caio Fernando, em que a mulher entendeu e aceitou, desaparecendo da janela no exato instante em que ele atravessou a avenida sem olhar para trás. Na verdade eu gostaria de ser ela. Mas se fosse, talvez Júpiter não encontrasse Saturno. Pois eu não teria essa sorte.
   Se isso for alguma forma tortuosa de paixão descrita nos contos de Caio, eu obviamente precisarei de uma bebida forte e mais do que 12 horas de sono. Eu precisarei dos Deuses ou Demônios que me puseram naquele lugar aquela noite. Os mesmos que enxergam o deleite no meu terror.
   Sua pele alvejada não sai do meu imaginário, me faz escrever coisas que me espicaçam sem pausa. Ontem na estrada vi um lençol de girassóis e me comovi e te pensei, como se fosse possível te ligar e dizer isso tudo. Como se fosse possível eu ser especial pra você, como você é pra mim e todos aqui já sabem. Te escondi atrás de Dionisio para não profanar o seu verdadeiro nome. E do meu nome você lembra?
   Anoiteceu, meu bem. Hoje você vai levar mais uma para sua casa, ela não desconfiará que vai estar tirando a roupa para o meu objeto literário. E amanhã você vai continuar vazio. Eu acho isso lindamente triste.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Continue sendo silêncio, porque temo você dizer algo e não ser mais interessante

Você possui o charme
da beleza suja
E a vibratilidade disso
me arruína
e me encanta,
tal como um delírio lisérgico
As sensações são irrefreáveis,
o que for estático
não me pertence
Meus gestos meticulosos
não abreviam e nem adiam
a perdição
Você consegue sentir
a estridência destes versos
mal feitos?
Você sente algo além
do fascínio por si mesmo?
Queria lhe conhecer, Dionísio
Mas está escrito
nos quatro cantos
que, só se pode gostar
de outra pessoa
quando a mesma nos é
desconhecida
Então não me atrevo
a quebrar este feitiço
Aceito a atração
que pelos Deuses me foi imposta
Mas por enquanto
só ouso dizer que
nem os esquadros de Calcanhotto,
nem as cores de Almodóvar
e Frida Kahlo, são mais bonitas
que a cor dos seus olhos.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Meu peito bate na laje

   Aonde tu andas, Dionísio? Ou aonde ando eu? Não te encontro, não te vejo. Abstinência. Entende? A única coisa que eu sabia que ficaria comigo. Mas preciso vê-lo em qualquer rua, em qualquer esquina, preciso vê-lo me vendo. Suas feições nas fotografias são tão miraculosas, têm vezes que tu pareces uma obra barroca, e nessa contemplação toda, vou ficando oca. Tu és desalmado, mas eu queria tê-lo uma vez mais, apressadamente, lentamente... Tanto faz, se me fizeres viva de novo. Peço ajuda a Drummond, que me socorra, pois não sei mais fazer versos. Tu vives bem com a desimportância de não me ver nunca mais e tomo de assalto as palavras de Carlos, (digo seu nome porque sou uma ladra respeitosa) como um dia já dissera por mim:
Dá mastigados restos
à minha fome absoluta
E eu aceito, calo no absurdo de tanto querer.

Título: Carlos Drummond de Andrade

13/12/2015