terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Para ver-me como mais um verme

Ele está no Uruguai agora, 
com o seu novo amor
Posando para fotografias 
em meio aos girassóis
Enquanto a vida gira
e me desenterneço  
Eu nem o conheço, 
mas escrevi sobre nós 
por incontáveis meses seguidos
É muito difícil definir
o que eu gostaria que fôssemos
Não o conheci num ônibus
e nem em um supermercado
Também não posso dizer 
que o inventei
Eu nunca tivera criatividade 
para desenhar um terremoto
daquela estrondosa magnitude 
Tudo o que eu quis para nós
se encontra dentro
dessa minha dificultosa atração nada remota
Há livros meus na casa dele,
talvez em gavetas abandonadas
Há aquele bilhete,
onde escrevi que
não poderia mais esperar
Pois, outros personagens 
me aguardam fora desse vendaval
Esses personagens por mais
ideológicos que sejam
não suprem minha necessidade
abismal]
de possuir em mim o maior de todos 
os encantamentos
Como eu disse no inicio,
ele está no Uruguai
com a família e ela,
esperando os festejos dezembrinos 
Parafraseando Adélia, 
cito que João está com com uma mulher 
que não sofreu por ele 
um terço do que eu sofri
Mas direi mais, 
ele está com uma mulher linda
e jamais será para ela o Jonathan de Adélia

Para sempre meu João

(Meu travesti poético)

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Uma esperança mais triste ao fim do meu dia

   Eu vou parar de escrever sobre ele, não vai ser por rancor, isso é uma certeza consumada. Se ele não mais aparecer por aqui entre linhas e paixão ocasional, é porque percebi que tentar prender alguém dentro de uma ilusão fadada é um devaneio perigoso, até para mim. 

Essa estória não se difere dos outros romances intituláveis que a nossa História já presenciou. Mas eu quis o seu corpo soterrado na terra que gerou as vegetações mais bonitas, o seu corpo sob o meu, escondendo a minha escureza.
    Eu tentei ser o mais clara possível, causando inveja nos dias nublados. Lhe passando o recibo da minha loucura e assinando toda e qualquer tristeza. No final que não fora escrito, eu não fui nem eu direito. 

Eu fui o que essa paixão foi. Desajeitada sádica carnavalesca. 
Desfilando meu psicopatismo nas poesias e avenidas dessa vida partida. 



Título: Manuel Bandeira

sábado, 6 de dezembro de 2014

Quase 7

Eu quero muito 
abrir um buraco 
no meu quintal 
para esconder 
de mim mesma 
as falhas todas 
que lembram-me
tal paixão burocrática
Todavia, a política
deste romance
me priva
À revelia das coisas
que não pedem entendimento,
eu quis sim, entender
Para agonizar em paz,
dentro da dignidade
que criei tendo uma caneta na mão
Fique sabendo,
meu coração
combina com buracos.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Escrevi essa dor pra você me curar enquanto lia

O deslumbramento
ao ver seu nome
contido num poema meu
Fez você escrever o nome
de outro alguém na sua vida                                                                   

sábado, 22 de novembro de 2014

Mais uma página da melhor degradação

A vida corre em quilômetros
Eu parei em frente ao espelho
para me ver chorar
Do que adiantaria 
pegar o meu batom mais bonito
e escrever no mesmo espelho
que sinto a sua falta
Se nem um poema lhe comove,
imagine uma frase
Imagine eu, 
em pleno estado de decomposição
Virando pó
Porque minha vida você virou para baixo
como quem termina a última dose de whisky, 
vira o copo e vai simbora

O drama sempre fica
O drama eu posso dizer que é só meu.






sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Sofrência secular

Ninguém sabia, até agora,
mas eu sinto 
insetos caminhando sob meu corpo
Me examino e nada acho
Acho mesmo que a Paranoia 
se encantou por mim
Eu quis pedir ajuda a ele
Mas me armei com a ilusão mais sensata
Pedi mesmo foi uma bebida forte
e o destilei na minha euforia
Ajeitei-me na cadeira de ferro
Na mesa daquele bar limpo demais,
para a sujeira da minha platonice urbana
Só havia guardanapos de papéis coloridos
Daqueles que as cores desbotam nas mãos
quando a cerveja começa a suar
Entrei em letargia, 
queria tanto um guardanapo 
branco
discreto
sem a pretensão de quebrar a frieza
daquela epifania
Porém, o súbito entendimento das coisas
ia bem mais além da disposição 
das cores de um guardanapo
Minha compreensão abrangeu
a cena:
eu
sozinha
no bar
pensando
nele
que hoje tem fotografias com cães 
das garotas com quem divide seu tempo
Eu não tenho tempo
Também não tenho um cão
Ainda preciso de ajuda
Minha gata se chama Juliete,
mas ele não perguntou 
de onde tirei esse nome
Agora, me pergunto
Por que quero este homem?

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Amor à la Dahmer

Me espera! Por favor, me espera...
Deixa eu bater na sua porta até você sentir medo de mim, mais uma vez. 
Eu quero lhe cravar a faca no peito pra lhe mostrar a dimensão dessa minha doença.
Depois degustar seus músculos e marinar seu coração com temperos cheirosos.
Me aceita com toda esta lama que despenca das botas que não combinam comigo.
Me aceita, que eu lambo o tapete preferido da sua mãe, que acabei de sujar com meu apelo de amor miserável. 
Fica comigo, eu largo o álcool e faço dos líquidos que te escapam da pele, os meus preferidos.
Chame de amor, essa doença que até mais cedo ninguém ousou dar o diagnóstico por medo de ser contagiosa. 
Cuspa na minha cara, jogue-me no chão com toda a poesia que você só julgou bonita.
O bonito lhe ofende, então eu passei a escrever o pior que fez-me sentir em prol da indiferença que lhe protege. 
Me proteja, das pessoas imbecis que não acreditaram em nós. 
Me envolva nessa sua bolha de homem mau, que corrompe tudo em sua volta.
Volta a desejar-me, com toda a minha loucura que atravessa fronteiras e vai além das guerrilhas mexicanas.
Meu drama mexicano é todo seu, você sabe. Quero sentir uma felicidade inesgotável que faça doer o peito, como o meu peito dói agora por não sentir felicidade alguma.
Ah, João... Você é tão bonito, que me dá vontade de arrancar a sua cabeça e lhe montar um altar para não sair da minha vista.
Comer os seus pedaços, em busca de qualquer salvação. Mentira, não quero ser salva.
Me roube a ideia do suicídio diário e me mate você mesmo. Definhando-me, negando migalhas da sua presença. Não ria, João... Você é o meu mais leve absurdo. Eu posso tirar a roupa para lhe impressionar, eu posso comprar uma arma também.
Me espera, antes que eu decida que azul marinho é a cor mais bonita para o seu caixão. 
Vou pegar o ônibus na próxima hora, meu bem... Não fuja, mais não. 
Pois para casar o seu demônio com o meu, eu irei até o inferno. 

terça-feira, 4 de novembro de 2014

O nome dele é João

Ele é a folha em branco 
desejando minhas palavras 
quilométricas
É a força da natureza
que me encanta com a garoa
mas me ganha com a ventania
Ele é aquele homem arredio
torcendo para eu lhe amarrar
com cordas trançadas
É para mim a Marília de Dirceu
e Dorian Gray de Wilde
Ele é o que ninguém acredita
Sem data no calendário,
sem fim previsto
E tudo o que eu não sei
sobre ele, eu sento e aguardo 
os dias me mostrarem
No embalo da paixão mais comedida,
vivendo sob a sombra do gostar mais trágico
Descansamos então na rotina cíclica e perene
desses poemas que perpetuo na vontade
de contornar os traços de suas voluptuosas mãos
Como se não fosse eu arquiteta ou artesã
dessa grandiosa obsessão.

domingo, 2 de novembro de 2014

Cerveja em copo de plástico

Hoje é um daqueles dias 
que não consigo nem me olhar no espelho, 
por repulsa das coisas que cometi 
na ânsia de querer mudar alguma coisa irredutível. 

A minha condição de permanecer um espírito fracassado 
está ligada ao meu gosto 
de querer sempre ser um alguém individual. 

Marcas do meu batom 
na camiseta do homem recém feito e desconhecido, 
decepção noturna, beijos vagos e olhares pudicos. 

Minha cerveja em copo de plástico 
equilibrou toda a decadência da noite. 
Meu batom derreteu com o calor
desse meu inferno particular.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Não devia

Não devia
Mas eu quis
Como no compasso
dos meus passos 
que não me tiram daqui
Na sincronia singular
de uma melodia triste
Nas rasuras do papel cansado
A poesia que não consola,
é a mesma que se desculpa por afligir 
Não devia
Mas eu quis
Como quem vai à padaria 
e não se importa de comprar pães amanhecidos
Não devia
Mas penso diuturnamente 
nas areias do Laranjal
E em como a brevidade
me assombra
Escrevendo um novo amor
ou pintando as unhas de vermelho
Nenhum dos dois eu sei fazer direito.



sábado, 25 de outubro de 2014

Divã infame

   Eu tenho vontade de colar nas minhas paredes todos os recortes de revistas e jornais que falam sobre amores e paixões que não foram muito longe apenas para confortar o meu corpo dentro desse meu literário temporal a antologia riquíssima de Drummond que embeleza minha prateleira já deve ter captado toda a energia ruim que paira sobre mim então intimamente falando creio que Carlos se compadece da minha exaustão passional todo esse esgotamento tudo o que deu o que falar e o que chorar está encruado na minha capacidade cognitiva é o puro clichê de que eu mesma estou me cortando e mastigando meus próprios pedaços a digestão como você bem sabe é lenta e a satisfação é tão vil conheço meu egoísmo mais do que conheço meu coração sei da tolice que é pensar em mudar o mundo com a caneta na mão enquanto só sei escrever sobre ego varrido pra debaixo do tapete mesmo sabendo que a miséria do mundo e sua humanidade é tão mais ordinária mas ordinária eu também sou pois não consigo mudar a mim mesma ou talvez viver como uma ratazana num bueiro fétido e escuro faça mais o meu tipo você faz o meu tipo você e todo esse seu ceticismo seu lema ''só acredito vendo'' mas fui eu quem tentou pagar pra nos ver até o fim você só largou alguns trocados na mesa para adiantar logo qualquer final quando a infância me era presente eu colecionava sabonetes por seus aromas cores formatos agora na faixa dos vinte conto os indefesos hematomas que adquiro ao esbarrar pelos móveis quando ando distraída pela casa e - ando muito - farejando resquícios de souvenirs recicláveis o meu pavor de hoje é ainda considerá-lo a minha pessoa favorita no meu pedaço do mundo parafraseando Carlos só posso concluir que se eu morrer morre comigo um certo imperfeito modo de te ver.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Passeando em todos os tempos nessa vida atemporal

Os olhos outrora adorno do rosto,
agora ameaçam a despencar da face cadavérica
Lábios que desfilavam cores do Disco de Newton
se veem rachados, abrigando o sangue seco
Ela jogada no sofá
esbanjando sua melancolia,
é lírico demais
Entre um devaneio e outro
pernilongos fazem festa em seu corpo
E pensa em
ontem
rejeição
lonjura
geografia
Vai se alastrando
sua invisibilidade
diante do mundo que quer devassá-la
E pensa em
outra cidade
unhas rasgando costas largas
tapas deliberados
ódio consentido  

Uma barata atravessa a sala

Havia muito tempo 
que não tocava em algo vivo.

(Lê-se: ... destruía algo vivo)

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Dos desejos apodrecidos

Banhar-me com gasolina
e riscar o fósforo
Deitar nos trilhos
e esperar o trem
Atirar-me em frente 
de qualquer automóvel
Pular no rio
mais fundo e poluído
Catar todos os frascos
e comprimidos da casa
e os ingerir sem medo
Voar 
da sacada mais alta da cidade
Estourar a minha cabeça
com um tiro
Me enforcar 
com o meu lenço mais bonito
Cheirar vinte carreiras 
de cocaína ou quantas eu conseguir
Nada é mais mortífero 
do que me matar 
dentro da minha própria poesia
Mas continuo aqui 
só para me surpreender com o meu final
Nisso, vou morrendo todos os dias.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Desaparecendo nele

Eu continuo 
escrevendo sobre ele,
porque morro de medo 
de não sentir mais nada igual

Sendo loucura ou doença
é por ele que choro quando bebo demais
Eu só quero essa ilusão
Para almejar versos limpos 
e exatidão volátil

Ampliando a hipótese de nós dois 
na certeza 
de todas as madrugadas

Ainda não sei, mas creio 
que ele tenha o cheirinho de vida fresca, 
aquela que antes de escrever 
eu quero viver

Compartilhando segredos sagrados, 
readaptando uma bela neurose
Ele me procurava 
só para contornar a minha calma

Agora estou aqui corrompendo 
o que ainda nos resta de melhor
porque eu posso ser o seu pior 
E ainda assim, ser seu amor

Cinco meses 
virou a nossa nova distância.



sábado, 11 de outubro de 2014

Pela minha pele nos seus pelos

Desligo a televisão, 
apago a luz
e as janelas permanecem abertas 
Transito entre os sofás 
e me sinto vigiada 
Paro em frente ao espelho 
apreciando o nada, 
A minha desatenção, 
o contentamento forçado
E volto com os rituais
mantras
rezas
simpatias
cartomantes

Tudo por um esquecimento
menos árduo.


30/11/2013

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Fazendo da tua vida o que teu coração te dá

   Eu posso usar Vanguart pra dizer que, quando chove na cidade, eu lembro de você... Eu lembro de você quando praguejo a distância. Lembro que o tempo era guiado pelos suspiros que me causavas. Lembro de você quando me vejo feito cachorro por alguém que  não tem um dedinho do seu encanto. Se tudo muda, eu deveria mudar também. Mudar a estação, mudar de atração... Quando me acho em belos olhos, eu lembro que você me deixou do lado de cá. E seguir em frente por enquanto não dá. Não dá porque não quero. E se demorou pra ser e agora continua não sendo, eu lembro que eu quis tanto. 
   Se dependesse só de mim, seria como naquela carta que lhe enviei no último janeiro triste, - porque todos são - iria descobri-lo por inteiro para nunca mais ter que escrever sobre outra pessoa. Você me entusiasmou por todos os vinte meses que ainda se estendem, creio que se lhe descobrisse eu estaria na maior das sarjetas existenciais. Há beleza nisso. No próprio pensamento da decadência que talvez fosse promissora. Mas até para cair bonita eu preciso dos seus empurrões delicados. 
   Lembrar você, faz lembrar a falta que me faz um bom abismo. Pois como divina masoquista que sou, venero o que me envenena. O sadismo também é devoto do meu coração. Eu posso lhe esperar na rodoviária ou no meu colchão, se quiser ser a vida da minha vida. Mas fora da minha cabeça, você nem se cansa mais para dizer, não.


Título: Vanguart

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Eu não tenho mais salvação

Você destilou a minha vida
nesta paixão que é impossível viver
Os meses que não nos falamos
me convidam a conhecer
todas as coisas que não entendo
Você foi o poema das duas sílabas
e a insensatez desta jornada inteira
Nunca lhe vi, hoje percebo
que nunca o inventei
Jamais poderia criar 
tal força cosmogônica 
Planetas lhe cercam, você não quis ser meu Sol
Estrelas lhe preenchem 
Você é a noite escura
Sempre serás o Céu
E Seu
Você é seu
É também muito meu e não sabe
Te quero desde as poesias imemoriais
Desde os fados mais dramáticos
e sonetos desequilibrados
Te sonho desde que me vi acordando pra vida
quando escrevi teu nome com o maior zelo do mundo
Essa poesia existe desde quando
você foi batizado com o nome João.

domingo, 21 de setembro de 2014

Caio, encosta em mim para não me ver caindo

O adorno 
mais interessante dos últimos tempos,
se tornou a infecção mais apreciada
por todos que me viram sendo usada ou lhe usando

Me olhava no espelho,
sem dor alguma
Porém, a ferida estava ali
crescendo todos os dias

Sem odor algum,
só aquela vermelhidão 
da maçã que ninguém ousa tirar um pedaço
por temer estragar a personificação da beleza

Você foi o corpo estranho
que o organismo expulsou da minha pele
O que era bonito aos meus olhos
me corroía por dentro.

Sobre o título: Referência ao meu amado, quiçá amante espiritual, Caio Fernando Abreu.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Poema para um desgraçado

Você me despiu
da minha delicadeza protegida 
para vestir-me com todo o cinismo existente

E todos os nossos disfarces
eu queimei com os restos da última carta
Eu paguei pra ficar no melhor camarote
para assistir o show que você nunca deu

Você me deve muito, rapaz
Depois de você, passei a invadir igrejas
Só para chorar em paz

Me incentivei a ficar nesse barco furado
Por gostar das causas perdidas
Mas as causas perdidas
é que se perdem de mim

Te escrevi dezenas
e mais dezenas dos mais profanos poemas,
pisoteei em sonetos, envergonhei a sanidade
e no fim
            [que não ousei escrever
Te aplaudi sem cobrar nada

Esse amor não vale vintém que seja,
esse amor não valeu este poema

Por todas as vielas que eu percorrer
daqui em diante, cuspirei teu nome nas valetas
à céu aberto
Porque estou abrindo meu coração pra dizer que,
você não valeu o meu nada.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

O senso de realidade degenerou toda a utopia remota

 O meu pesar de hoje tem vista privilegiada. Da sacada do quarto andar eu contemplo a pressa dessa cidade, as flores das sacadas mais próximas... Ainda tenho a visão do ônibus verde esquecido no outro lado da rua, os numerosos carros vermelhos tomando conta do estacionamento do edifício. O portão automático que não fica mais de cinco minutos fechado. O menino com a sua enorme mochila preta, sentado sozinho no playground, e tudo isso acalentado pelo frio agradável. E para além dos fios de eletricidade, eu vejo os campos que espiam a nossa urbanidade, o que faz-me sentir uma delicadeza indizível... Enquanto meus olhos são conduzidos para dentro do furacão e minha caneta dança traçando minhas letras tortas sob as linhas retas, imitando a vida nesse papel. 
   Sinto necessidade de ti, minha escuridão mais iluminada. Você nunca mais me leu, eu não mais te escutei. Mas continuo escrevendo como se fosse te ver no fim desse dia. 
Fui tão boa que, apodreci
Veja, sendo má, floresci  
Quis ser você, aí você se foi.

sábado, 6 de setembro de 2014

Estando aí eu fui embora de mim

   10 de dezembro do ano mais confuso que já tive seis horas de viagem garoa leve areia branca água gelada roupas molhadas ventania harmônica exposições culturais ansiedade evidente rios bem desenhados pela natureza igrejas monumentais sebos impecáveis os mesmos degraus que em outrora escrevi pessoas bonitas pessoas bonitas e despreocupadas o fedor de esgoto em frente ao único shopping daquela cidade minha saudade programada a visão estonteante do quarto andar da imensa janela daquela faculdade o pastel de queijo delicioso da cantina mais próxima meu desespero nada opcional as ruas largas e meu medo estreitando dentro de mim vontade de nunca mais ir embora depois bater na tua porta e dizer que a fantasia me fez ficar aquelas praças das suas fotografias me mostraram momentos que eu nunca irei ter a biblioteca pública abrigando milhões de estórias e histórias também abraçou a poesia que fomos eu não te vi mas o enxerguei em todas as esquinas mais desertas da sua cidade será que você me entende? me senti parte daquela população como se eu fosse inegavelmente mais alegre e maldita na sua urbanidade penso que em nome da mesma fantasia eu não o procurei e se te procurasse o que eu estaria escrevendo agora?


terça-feira, 2 de setembro de 2014

E só merece a vida o que é senhor da morte

Eu gosto do que não existe,
e essa coisa ou isso
está no escuro do quarto
quando apago a luz
E em todos os transeuntes
mais estranhos que
decoram as ruas
Essa coisa ressoa pela casa
quando todos dormem
Conversa comigo
quando estou 
com a caneta na mão
Isso que chamo
gentilmente de Coisa
me laça e me lança
ao sem volta
E eu volto
mas só por mim
Essa coisa
está nas gotas fracas
que escapam pela torneira
e nos gatos que desfilam
no meu telhado
A coisa 
está nos agudos
da Eva Cassidy
e em todos os homens,
que me olham com perdição
O que não existe
compõe o meu desespero,
acalenta minha covardia
Essa coisa
habita por detrás
dos meus olhos de pesquisa,
enquanto eu percorro
todas essas lápides
tentando achar o teu nome
Só pra saber se 
você está mesmo nessa vida.

Título: Cecília Meireles

domingo, 31 de agosto de 2014

O Domingo não espera nada, ao contrário de mim

Domingo passado,
amigos bêbados
músicas loucas
sofá quebrado
o filme que não assisti
a fumaça
dos nossos cigarros 
levava meu pensamento 
até você
Vozes e gritos
risadas escandalosas
querendo roubar 
meu devaneio 
Hoje, domingo
não sai de casa
Quero pensar em você
sem interrupções
Não há nada 
que eu possa fazer,
a não ser, escrever...

[sobre sofás e corações quebrados]

























Ilustração: Conrad Roset 

sábado, 23 de agosto de 2014

Eu subo para baixo

Por baixo do sangue,
das veias imundas
Além da natureza morta
pregada na minha parede
Olhos diabólicos 
me encarando no espelho
Aquele rosto 
me sorrindo a catástrofe 
mais ornamental
Nossa engrenagem movida à barro
querendo ser concreta
Enquanto a vida se esfarinha
por não decidirmos pelo medo
ou a maldade
A destruição é diária,
o amor é em conta-gotas
A morte nos espreita 
com tamanho zelo
E até nos brinda com a sarjeta
Os espasmos de alegria,
o cotidiano não perdoa
Aí nos contempla com
doenças e morfinas
e fraldas e sondas
A fantasia, 
a rotina não deixa passar
Nos condena com depressão 
e suicídios quase que teatrais
Somos o rebanho 
mal ordenhados
orgulhosos 
poeticamente abatidos
Somos os versos 
preguiçosamente escritos
só para preencher algumas linhas 
de qualquer livro
Estou me tornando essa pessoa oca
querendo renascer numa escultura barroca
Eu sou o teu fim
decretando o meu começo.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Tu tu tu tu tu no meu coração

   Ontem eu amanheci naquela casinha de madeira verde, com os fundos para o campo mais verde ainda. Só faltou chover para o aroma de terra molhada inebriar o dia todo. Faltou você para completar o meu instante bucólico. Hoje prometi dormir mais cedo para ver se te encontro lá junto da chuva. Deixarei a velha janela aberta, para ter os minutos a mais da visão tua, antes de te escutar batendo em minha porta. Te namorarei por todo o trajeto, da cerquinha de arame farpado até lhe ver em frente ao fogão cuidando a água para o nosso café. Assim, eu te cuido, homem. 
   Você me dói, como todas as canções de Damien Rice e precisa saber disso. Você me preocupa, como todos os poemas que anseio por não ter tempo de escrever. Você me tem, como a harmonia que um dia tive, antes de saber o seu nome. Então, tenha misericórdia desse meu gostar campesino... Se o Sol nos agraciar amanhã, saia comigo de mãos dadas por entre essas laranjeiras e deixa eu te olhar como quem nunca sentiu a dor do amor mesquinho. 
   Depois sirva-se de mim, enquanto te faço poesia. Beije todo o meu corpo pequeno e esguio, na cama dos lençóis alvejados. Deixa eu lhe morder até o sangue lhe escapar da pele e grunhidos da boca. Escreva essa nossa atração louca dentro de mim. Me torne mais louca do que já sou. E se der tempo, enlouqueça urgentemente por mim. 


Título: Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Não quero esfriar essa febre

Você se esquiva de mim
Tal como o Diabo da Cruz
E eu me pergunto em que ponto
esse gostar deixou de ser saudável
           Ou será sagrado?
Trocaria todos os infindáveis beijos
que ganhei que dei que desperdicei
Por você que não entende nada
                                     de mim
Todos os moços de bom coração
que ingenuamente me quiseram,
                     me fazem repudiar a ideia
                            dum romance sossegado
Até hoje eu só escrevo 
para o seu coração petrificado
Pois vivo na penumbra da possibilidade
                                                 perdida 
Eu que não te conheço, 
entendi que tu precisas de salvação
No meu ímpeto traço de benevolência, 
escrevi para lhe ajudar, ajudar a querer-me
Agora, aqui no fundo desse buraco negro 
da minha adoração                     
                           irrefletida
Peço que alguém jogue-me a corda
Enquanto decido se me salvo ou me enforco de vez.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Essa cidade que me guarda, que me mata de saudade

Admirando os amores pela vitrine
Enquanto os garis limpam a agonia 
que eu deixo nas ruas por onde passo
                                                                ''E essas ruas não têm mais nada de mim''
Que trabalheira! 
Escrever o amor que nunca me tiveram
Meus vinte anos pesam o dobro,
quando dobro a esquina de casa
e ninguém me espera no portão. 

Título/Aspas: Três da madrugada - Gal Costa

sábado, 9 de agosto de 2014

Minha falta do que fazer resulta nisso

   Eu fico aqui pensando que só posso contar comigo mesma, e quem sabe com todos os livros espalhados nos meus armários e embaixo do travesseiro. Ontem antes de dormir eu não consegui ler, porque deitei a cabeça e fiquei lembrando de você rindo só para mim e isso não vai mais acontecer. A ressonância disso nos meus dias, abala mais do que a minha estrutura emocional. E as sensações ruins são as únicas que me acompanham. 
   Exemplificando as mesmas, são coisas do cotidiano, sabe? Coisas que nunca darão certo, coisas que demorarão para se concretizar, pessoas boas demais, pessoas que gostaria de desconhecer, sentimentos que queria muito nutrir, outros sentimentos que abomino em mim mesma... Aquele vazio bonito e existencial de cada dia... O que desencadeia muitas outras coisas tristes e até indizíveis.
Deixa-me dizer que você foi o sabonete que eu gostei de apertar com as duas mãos pra vê-lo escorregar e cair no chão e nunca se desmanchar, não por mim. Fazia isso para me dar o encantador e árduo trabalho de tê-lo nas mãos já sabendo que não poderia me pertencer. Não assim, e pra me enganar digo que não agora. Mas então quando? Se deixamos o abismo entre duas cidades nos engolir... Seria fraqueza? Será uma Ilusão escrita não por mim, mas por todos os Deuses que em outras vidas desapontamos? Creio que só eu esteja pagando por isso agora.
A doença de cultivar uma veneração por alguém assim, assim tão singular e autossuficiente. Oscar Wilde escreveu que, uma grande paixão é privilégio dos que não tem nada para fazer. Eu parafraseio Drummond e digo que, a paixão tal como a poesia deste momento, inunda minha vida inteira.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Um certo ar horroroso de terrível depressão

   Cada rua, cada esquina e avenida que já me viu passar carregando mágoa nas costas, sabem que se o tempo de hoje não fosse aquele tempo que perdemos, eu te diria que, te aceito com todas as suas amigas bonitas, até mais do que bonitas e inteligentes te adorando antes de mim. Talvez eu lhe contasse do quanto queria te conhecer pra não precisar te inventar. Percebe que nessa estória, o que é doentio também é tão delicado? A desfiguração, meu bem, nos veste tão bem. 
   Eu nunca pensei num romance com piqueniques com toalha xadrez em parques incrivelmente verdes, quiçá melosidades que não me agradam nem no cinema. Acho que você soube, que o que faz a minha cabeça são as sensações sem rótulos, a poesia sem pretensão e o som dos pratos espatifando-se contra a parede quando tudo dá errado. Talvez em outros dias eu diria que essa minha vidinha mansa me serve, mas a falta de me ver sendo furacão-e-você-a-calmaria-ou-eu-a-calmaria-e-você-o-furacão abisma as minhas melhores memórias.  
   Talvez eu precisasse dizer que esse meu lírico encantamento me maltrata, porque dorme e acorda comigo, porém, não me olha nos olhos. E é sempre desse jeito, eu sem jeito recitando uma atração faminta por alguém que não tem jeito.  

Título:  Lawrence Ferlinghetti

terça-feira, 29 de julho de 2014

Escrevo porque senão eu morro

   Escrevo porque não sei desenhar, nem cantar. Embora eu goste de cantar meu blues todos os dias. Escrevo mesmo falando muito. Também escrevo muito. Escrevo para homens que pouco leem. Escrevo porque esses homens só não me alcançam porque não querem. Escrevo porque o ingresso do show que eu quero ir tá caro demais, acho que não vou mais. Escrevo porque não sou das matemáticas e mesmo assim ainda escrevo mal.

   Escrevo porque só gosto de quem não dá nada por mim. Escrevo porque não tenho peso para doar sangue. Escrevo porque não tenho aparência de moça mais velha e os moços que quero me veem como menina moça. Escrevo porque desço a rua já pensando que não tenho nada para fazer em casa. Mas adoro ficar em casa. Escrevo porque não tenho dinheiro para comprar todos os livros de todos os meus escritores preferidos.

  Escrevo por querer encarcerar na minha poesia quem não para de se esconder atrás das minhas mil paranoias. Escrevo para a tristeza se afastar. Escrevo porque não posso me aproximar. Escrevo porque não me dou bem com a minha mãe. Escrevo porque um dia quero ser uma boa mãe. Escrevo porque meu-primeiro-suposto-amor não me amou. Escrevo porque não sei qual é o meu filme favorito. Escrevo porque quando eu crescer quero escrever igual a Hilda Hilst. Escrevo porque quando eu crescer quero sentir como a Adélia Prado.

  Escrevo porque sou obcecada pela demência alheia. Escrevo porque eu mataria se pudesse, e vejo que nada me impede. Escrevo porque sou covarde. Escrevo porque quando eu falo, nem eu me escuto. Escrevo porque não posso fazer sua risada tocar no rádio. Escrevo porque você não quer que sua risada toque no rádio. Nem em mim. Escrevo porque sou a ovelha negra da família. Escrevo porque gosto de ser assim. Escrevo porque não sou o orgulho de ninguém. Escrevo porque não preencho ninguém. Escrevo porque ninguém têm nada com isso.

   Escrevo porque dói. E doer é bom. Escrevo porque sou masoquista. Escrevo porque como Caio Fernando Abreu, quero ser amada por alguma coisa que escrevi. Escrevo porque aquele homem disse que iria lembrar de mim pela minha poesia, mas nunca mais me procurou. Escrevo porque não consigo mais beber sem chorar. Escrevo porque chorar é patético quando é por alguém que nem sabe que eu detesto cenouras. De novo as cenouras.

   Escrevo porque não posso adotar todos os gatos abandonados pela cidade. Escrevo porque meus amigos vivem com pressa. Escrevo porque eu só tenho a pressa de escrever mais esse texto. Escrevo porque  deixar de ser criança foi a pior coisa que me aconteceu. Escrevo porque não ando de bicicleta há anos. Escrevo porque desaprendi a subir numa árvore. Escrevo porque reconheço quem não me conhece até de costas. Escrevo porque meu nariz é feio. Escrevo porque seu nariz afrontoso não sai da minha cabeça.

   Escrevo desde guria, quando fazia listas do que gostaria de ter. Com sete anos eu queria ter uma vaca. Saudade. Escrevo porque hoje só quero paz. Paz pra nós. Escrevo porque não posso fazer nada quanto a guerra no Oriente Médio. Escrevo porque ganho pouco e sou explorada. E não me atrevo a largar esse emprego. Escrevo porque não aceito o prazo de validade que as coisas/sentimentos/pessoas têm. Escrevo porque não posso escolher a minha família e meus amigos estão se extinguindo. Escrevo porque nunca viajei de avião e a tragédia vive no ar. 
   
   Escrevo porque mesmo tendo aprendido a não esperar muito faço isso por ilusão. Escrevo porque não sei fazer outra coisa. Escrevo para mulheres que nunca foram amadas. Escrevo porque não me acho bonita, mas a vida é. Nem sempre. Escrevo porque gosto da contradição. Escrevo por Inácio e Antonina, meus filhos bem amados que ainda vão nascer. Escrevo porque vou ter três filhos, e o nome do terceiro já escolhi mas não falo. Penso que vai ter o nome do pai. 
   
   Escrevo porque inventar é a minha única forma de viver. Escrevo porque só quero fazer isso. 


   Escrevo por amar Adélia Prado, que escreveu isso:

Eu não servia para ter nascido,
para comer com boca, andar com pés
e Ter dentro de mim oito metros de tripas
desejando a filigrana de tua íris
cuja cor não digo para não estragar tudo
e novamente ficar coberta de ridículo.

   Escrevo, porque não fui eu quem escreveu:

Quem és? Perguntei ao desejo. Respondeu: lava. Depois pó. Depois nada.

Foi Hilda. Deusa dos Grandes Nadas

sábado, 26 de julho de 2014

Gosto do meu chá, mas prefiro você

   Indo para o ponto necessário, deixa eu lhe falar que há homens dizendo-me coisas tão bonitas... Mas não, não é dessa vez que você me perderá. Pois eu fico pensando em você que nunca disse nada, ponderando o ridículo e a insensibilidade. Querido, eu preciso de alguém que sinta a poesia da vida comigo. Depois cubra meus pés, aqueça meu chá e vá embora. E deixe um bilhete embaixo do meu travesseiro, dizendo voltar amanhã. 
   O seu problema, é que, você não gosta de chá. E nunca mais voltou.  


quinta-feira, 24 de julho de 2014

Foi bom pra mim ser afligido

Você não me olha, também não te olho
Nisso vai enchendo nosso diálogo de 
                                psicologismos
Enquanto eu descasco o esmalte das unhas

Meu poder de construir bons versos
não existe quando rodeamos tanto 
pra dizer que se ficarmos juntos
acabaremos um com o outro

Mas a verdade é que, você acaba comigo
quando sei que brinda à vida sem mim
Quando diz que não pode gostar de alguém tão... 
                                     fantasiosa

Sendo que eu fantasiei isso
Você me dizendo que fantasiei demais

Você não me olhou porque você 
                     não está aqui
Você nem existe
Então não existiu conversa alguma
Agora vou pintar as unhas de novo.
 
Título: Do salmo 118

sábado, 19 de julho de 2014

Sobre as cenouras

   Eu não gosto de cenouras. Muitas coisas você precisaria saber sobre mim, para entender porque ajo assim. Você nunca me telefonou e eu já peguei o telefone por menos. Um dia dissera que eu escrevo coisas belas e quem sabe poderíamos escrever um poema juntos, e eu já pensando no nosso livro. O poema não saiu, que pena. Eu bebi teus detalhes o mês inteiro só pra não te afastar da minha realidade. Lembra quando disse-me que as pessoas que me leem iriam gostar de ler algo escrito junto com o homem sobre quem tanto escrevi? Eu também iria gostar. Seria assustador. Como todo esse meu gostar folclórico. Sabe, eu não gosto mesmo de cenouras... Mas você não faz ideia disso, porque sempre conversamos sobre tempestades emocionais. 
   Eu o coloco no escuro da minha sala, quando apago a luz. E me sinto mais destinada a te encontrar nessa vida. As pichações atrás das portas dos banheiros públicos deixa esse momento mais comovente, a poluição visual também me agrada. Você me agrada e me desagrada com a mesma facilidade. Não dou o que falar na mesa do bar, mas ao contrário de mim, tu me dá o que escrever todos os dias.
   Preste atenção, eu não gosto de cenouras. Nunca foi meu objetivo ser um desafio psicológico, mas eles não me deixam sentir paz e claro que eu não me dou sossego. O meu cotidiano supera qualquer filme de Almodóvar, acredite, eles me amesquinham e eles me encantam com tamanho profissionalismo. Mas me desgraçam a cabeça com a falta de profundidade. Eles me param na rua para vender laranjas, digo que prefiro frutas vermelhas e quando dou por mim estou em casa com duas dúzias das laranjas mais amargas do mercado informal. Eles me ligam, marcam compromissos e desmarcam cinco minutos depois. Daí suspiro, praguejo o mundo e volto a lavar a louça. 
   Eles controlam os meus passos, meus horários alternativos e me julgam pela quantidade de café que bebo. Eles me chamam pra conversar sobre as pessoas, eu digo que se fosse meu caso preferiria comer uma mulher tal como a Audrey Tautou e me chamam de machista por não optar por um tipo de atriz pornô. Eles me mandam ir dormir e porra cadê meu sono?! Eles falam em homens, digo que prefiro-os-altos-não-magrelos-mas-também-não-obesos e óbvio que dizem que exijo muito. 
   Eles dizem tudo bem, vamos tentar de novo... E nunca mais falam comigo. Eles se perdem de mim e me culpam pelo ocorrido. Eles quando gostam de mim não me desesperam, aí eu os deixo pra lá. Eles recebem minhas correspondências e não se comovem. Nessa hora passo a odiar o carteiro que foi responsável demais e entregou o que eu enviei. Meu telefone não toca, sim, não está quebrado. Mas se eu continuar ansiosa vai estar. Eles zelam pela minha autoestima dizendo-me, não é bem por aí, tu não és assim ou não sejas assim pateticamente incorreta por gostar tanto pra tão pouco ou a loucura após perceber a grande consideração pequena. Acho que estou roubando citações de T. Bernardi porque já não sei o que escrever. Olha só, ainda não gosto de cenouras. Só quero que entenda isso. 

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Demonizando o nada

   Após 51 dias eu cortei o silêncio, nosso silêncio mutuo. Não foi premeditado, nada é... Deixamos de nos falar por causa da incompatibilidade nada poética, e fui atrás de você, porque rir com você era rir de verdade. Você nada disse, e mais uma vez eu fico com o papel mais dramático dessa novela nada mexicana. Acho que dizer o que sinto, nunca funcionou com nós. Você tão incógnita, eu deveria ser mais subentendida. Mas poeta é assim, quase não fala e quando fala, aproveita e vomita. Vomita sentimentalidades, cospe redemoinhos admiráveis. E vez e sempre engole não só sapos, mas todos os anfíbios e répteis inimagináveis 

   Agora fico aqui, adoçando esse copo d'água, pra acalmar toda essa ordem Lepidoptera que vive em fúria no meu estômago. Sabe, andei pensando que quem têm por hábito escrever, são pessoas perigosas. Mas gostar de você é mais perigoso ainda. Talvez você continue com essa greve de palavras, cultivando a indiferença. Simplesmente porque eu sou inerte na tua vida, enquanto eu me agravo escrevevendo sobre o que não acontece, puramente por diversão. Depois que nos afastamos, apareceu 7 domingos na minha semana. Veja, o quão chatos são os meus dias quando não sei dos teus. 

   Também não sei a hora de parar, me para.  Você me induz a sentenciar sandices, porque és o índice da minha loucura e o indicio da minha desgraça. Se não mais nos falarmos, saiba por aqui, foi bom porque não aconteceu. 

(Mas se acontecesse... Ah, meu bem...)

domingo, 13 de julho de 2014

E mesmo sem te ouvir, eu já conheço a resposta

Tenho roupas para lavar
nesse domingo tão bonito

Mas agora sentei para escrever
sobre nossas éticas particulares,
ou orgulho fétido

Que nos impede de insistir
no que parece ser lindo 
mas também arrasador

Por onde passo
exalo conformismo

Quando meu coração dispara
Você me diz, para
Eu parei foi na tua

Essa história seria igual
se fôssemos diferentes.


























Título: Autoestima, Lulu Santos

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Há milênios te sei e nunca te conheço

   Te quis com gosto de feijão, pasta de dente e até café. Quis da forma mais errônea, até sem fé. No carnaval que não sei dançar e no tango que só admiro. Assim, assado, cozido e digerido pela minha poesia... Costurado, alinhado em mim. Quis sem querer, até me ver querendo tanto. Te quis com todos os seus amores, mesmo sem me amar. Quis pra fazê-lo mar, mesmo se eu não rio. Quis de verdade pra escrever mais uma mentira. Tu aí em Pelotas, eu aqui no Alegrete, sendo menos alegre. 
   Te quis no outro lado da linha rindo para o meu gravador só para eu sentir mais dor. Quis pra não querer mais ninguém. De modo mais vero-romântico, sobrenatural e aflitivo. Eu abri o meu cotidiano fatigado pra aceitar teu entusiasmo que revigora o meu. 
Te quis, 
logo eu 
que nunca sei 
o que quero. 

Título: Hilda Hilst

[06/06/2014]

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Sobre o impróprio

Você me arruína, homem. E eu gosto assim...
De viver com a serenidade cheirando a carniça
Me espreita todas as horas de todos meus dias
                                                        cansados]
Decompõe minha vontade de afastamento 
Cada vez que ressurge atrás do meu abismo
                                                      literário] 
Porque aprecia a maneira como escrevo
nosso desencontro
Encontrando remediação 
para o nosso falso descaso
Nosso que não é bem nosso
Eu quero viver essa relação deficiente 
ambientada no plano das ideias descabidas 
Porque é verdade, sempre foi...
Ninguém te inventa como eu
Se for para ter medo,
te dou o meu.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Feito louca, alucinada e criança

Abre a fresta da janela,
senta na beirada da cama
E aprecia as nuvens
se liquefazendo lá fora
Chove como se Deus
também estivesse triste
Penso em suicídio 
todos os sessenta segundos
de cada minuto
Como salvação
Como conquista 
da verdadeira zona de conforto
Está tudo se desfragmentando,
pedindo pra eu virar pó
Minhas tristezas são irremediáveis,
sinto que viver é apenas isso
Eu já não suporto esse isso
Transformando catástrofes em poesia,
parece que já morri faz tempo
Mas estou aqui escrevendo 
meu obituário.



terça-feira, 1 de julho de 2014

Detalhando a falta de detalhes

   Estou tão absorta com a escassez de detalhes. Vejo o cão defecando na praça e acho lindo. Aí penso que cães defecando também é um detalhe. Como aquele cara que até ontem era meu amigo e disse estar apaixonado por mim e nessa manhã atravessou a rua ao me ver porque falei pra esquecer o que me dissera. Ser rejeitado é só um detalhe. Que ele não absorveu. Nem eu. 
   Poderia preencher o calendário com todos os dias que desisti, mas as vezes que voltei atrás ocupam toda a história. Eu sempre volto atrás por uma boa paixão. E quando digo boa, acredite, é a paixão mais cruel que já senti. E isso é só mais um detalhe. Parecer uma batida de carro, que todos param e olham para contemplar o estrago, é o detalhe que adquiri de você. 
   Você foi a pessoa mais descontraída que não conheci, e todos os homens que me veem tomando sorvete sozinha pelos cantos dessa cidade, me avistam já sabendo que meu adorno mais bonito é a solidão. Por isso que escrevo suavizando todos os golpes. 
   Será que já lhe disse que o coloco nos bares e calçadas que não te conhecem? Te coloquei dentro de mim, que também não te conheço. O poder que temos de parecer pueris se alia com a vontade de decifrar o que não conhecemos.
   Alcione Araújo escreveu que, só há paixão se um não conhece o outro. Que bonita fatalidade. Mas de qualquer forma...


















(Arquivo pessoal. Livro, Cala a boca e me beija - Alcione Araújo)