quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Um poema que perdeu tempo

Outro caso
Que levamos com descaso
Nosso medo de nos envolver
De acabarmos seduzidos
Você me deu prazer
Eu lhe dei prazer
Mas nosso Sol em Libra dramatizou tudo
Eu lhe toquei com
carinho
fome
exatidão
Você me tocou com
afeto
desejo
despretensão
Não fomos nada inocentes dentro dessa atração
Você gemendo nos meus ouvidos
Eu vou lembrar em outras camas que eu deitar
Eu batendo na sua porta às 5 da manhã
Você vai lembrar
enquanto tentar conhecer outras mulheres
As brigas
Palavras difusas
Você me querendo num dia
- E repetindo infindáveis vezes -
No outro fala pra eu não mais procurá-lo
Acabou tudo
Que tudo?
Não tivemos nada
Suas camisas que sujei de batom
Meus cabelos decorando o chão da sua casa
Logo isso será nada
Você queria que eu escrevesse sobre isso,
só não sabia que ia ser o final.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Menino, deus urbano, neto do sol.

                               [com você eu tenho mesmo que me conformar]



   Ele gosta de beijar homens. E ele queria um lugar que pudesse beija-los e ser visto sem pudor e espanto. Ele quer beijar homens durante o dia, longe das quatro paredes e longe do breu da noite. Ele é um desses caras, extremamente bonito que a mãe cobra dois netos e que arruína mulheres com seu perfume e olhar por entre óculos escuros ao cruzar a avenida. Ele quer beijar outro cara, mas ele arquitetou um personagem para si mesmo, aquele que vive nos bares se deleitando nos pescoços da juventude feminina da cidade. 
   Mas ele beija rapazes porque é o que mais gosta de fazer. Ele está beirando os trinta anos e só quer beijar outro homem em frente ao quiosque, ou dentro do mesmo bar que tenta ter uma ereção ao beijar uma mulher, duas mulheres por madrugada. Ele parte o coração das mesmas quando se deita com elas e faz tudo certo, goza e oferece orgasmos e afagos (e)ternos. Depois nunca mais. Ele continua vazio. 
   Este papel está lhe cansando. Ele quer beijar o seu rapaz no meio da praça central, depois encostar sua cabeça no ombro dele e suspirar após um dia de poucas vendas no trabalho. Ele quer que a sociedade entenda que ele gosta mais de ser penetrado do que penetrar. Mas ele penetra vidas e borra batons até o raiar do dia enquanto pensa que pode tentar fazer com que suas vontades sejam respeitadas mais tarde. Agora ele só quer ser o homem que beija mulheres como quem toca em algodão doce. Ele é doce, e há sempre alguém que se desfaça.

17/10/2016



segunda-feira, 7 de novembro de 2016

E ele é, o meu amor pelos espaços

De manhã eu queria não lembrar
Minha desventura é recordar
Do andar majestoso
E de cada ruga ao lado dos olhos
Verdes lindíssimos]
O aroma amadeirado e de notas fortes
Mesclado ao cheiro de solidão opcional
Saudade
de cada centímetro da sua pele
onde eu pude habitar
Os dias têm sido tão angustiosos
Sem a certeza de que você ainda me lê
e de que aceita essa minha paixão estrófica
Aceita?
Deixa eu te purificar com minha interioridade invulgar
Como se eu fosse divina
Como se eu fosse profética
Como sou sua.


Título: Florbela Espanca

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Me queira bem, meu bem.

Suas mãos
em volta do meu pescoço
enquanto se deleitava em mim - Eu lembro
Nossos suores
se transmutando em vontade
de sermos um só
Pelo menos por alguns segundos
Minha respiração embargada
nos ouvidos do único homem
que fez-me sentir
mulher
Seus olhos flamejantes
Me passando a sentença
de que juntos
Somos sim,
produtos inflamáveis
dentro dessa atração perigosa
Eu te quero tanto, homem
Deixa-me decorar sua nuca
com minhas marcas de amor marginal
Seja meu
Dionísio
Rodrigo
João
Seja o homem que me queira
e não precise de mais ninguém.



















Imagem: Nickie Zimov

sábado, 15 de outubro de 2016

A grande mentira que ele era, era verdade.

                                                          Sugiro que leia escutando Olhos nos olhos, na voz de Maria Bethânia.




   Lembro da madrugada que eu estava no bar e entreguei uma carta para ele e logo depois o vi beijando uma menina, quis chorar e saí pra fora, liguei para uma amiga às 4 da manhã dizendo que queria voltar lá e pedir minha carta de volta. É engraçado, mas dói bastante ainda. Sabe quando acontece algo ruim? E você pensa: Daqui há um ano estarei rindo disso.
   Um ano depois, não estou rindo. Porque foi algo pesado. Sou apaixonada pelo que inventei dele, a única coisa que é real são aqueles olhos verdes famintos. Ele é o homem mais lindo da cidade. Não digo só pela aparência, mas a maneira como ele anda e se porta, o jeito que ele pisca os olhos... É lírico. 
   Eu o reconheço de qualquer jeito e isso me entristece. Vê-lo andando distraído pelas ruas dessa cidade acaba comigo. Porque eu me distraí escrevendo sobre ele e agora não há nada. Nunca houve, apenas migalhas. Mas eu me agarrei tanto nisso. Ainda sonho com ele e acordo me perguntando o porquê. Calcanhotto perguntou para que servem as ruas, e eu também gostaria de saber. Mas para que serve esse desgosto com gosto agridoce na boca? Por que digo seu nome na intenção de me salvar? 
   Não posso lhe trazer de volta para minha vida cada vez que o vejo no outro lado da rua sorrindo para o estrago. Me sinto uma criança de 5 anos que só quer sair correndo sem perceber que vai tropeçar nos próprios pés. Eu sempre tropeço por ele.

Obrigada, Caio Fernando... Pelo título.


sábado, 8 de outubro de 2016

des.co.nhe.ci.do (particípio de desconhecer)

                         Pessoa cuja identidade se desconhece; estranho


   Inventam datas para tudo, não é mesmo? Já pode virar feriado nacional o dia que você me deu o último beijo embaixo da chuva naquele fim de noite? Ah, já é feriado, de Tiradentes. Cê lembra? Essas coisas corriqueiras também deveriam sair no jornal. 
   Eu acho que te amo agora, porque depois de tanto tempo sem nos falarmos, sem nos vermos, sem querer, eu tirei o dia para pensar em você e escrever isso. Juro que troquei a estação do rádio agora e está tocando aquela música de quando eu te toquei pela primeira vez no escuro da sua sala. Queria que você estivesse lendo isso e me perguntasse que música é... 
   É, não te esqueço. Você me cortou e jogou sal nas minhas feridas e mesmo assim eu escrevo. Não consegui me apaixonar por outra pessoa, a cidade me embrulha homens mais vulgares que você e eu acho graça. Só em você achei poesia.



















Imagem: Demi McCulloch

domingo, 25 de setembro de 2016

Amanhã recomeço e envelheço

        Amanheceu
Eu passei batom e sai
Querendo que todos me vissem
Vissem o quão feliz eu sou
Mesmo que apenas eu saiba 
que sou uma esfarrapada mentira
Sempre chego atrasada
Não sei atravessar a rua
e derramo café na roupa
Coloco os fones de ouvido 
e finjo que não dói quando me ferem
        Entardeceu
Deito no sofá, fecho os olhos
queria desintegrar, não existir
Leio poesia, finjo que escrevo poesia
Penso nos dias ceifando sonhos
Planos aperfeiçoando meu desespero
Escuto músicas doloridas 
e vejo o sol dizendo adeus
Enquanto lembro que certas pessoas 
nunca disseram nada
         Anoiteceu
Puxo uma cadeira e me escoro na mesa
Olho para o nada
O pão não alimenta, nem o arroz
Me retiro e recito mantras
Amanhã ficará tudo bem...
Esqueço o batom e deito para dormir
Quem sabe eu sonhe e seja feliz mais vezes
E seja menos desastrada e não suje a roupa
E acorde mais cuidadosa e saiba olhar para a sinaleira
E que eu chore quando me ferirem
Porque sou humana
e a vida é besta
Deus e Drummond 
souberam disso antes de mim.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Sobre o G

    Eu não queria escrever sobre ele por causa do estereótipo de escrever sobre alguém e criar irrealidades acerca do que me é permitido ver. Mas como creio já ter finalizado nossos remotos encontros sórdidos, agora me sinto livre para discorrer sobre as feições joviais e pele alva e cheiro de vontade à flor da pele desse menino que me emaranhou em edredom e excitação. 
   Seu gosto na minha boca, suas mãos na minha cintura, ele em mim... Isso poderia se tornar um conto erótico se eu fosse menos contida. Seus vinte anos reacenderam minha fome de perdição de selvageria de lascívia. Ele é conhecido por suas tesouras e navalhas, ele é artista também. Eu corro com tesouras imaginárias e sou cortada de tudo que possa se tornar bonito ou edificante, me acostumei com isso. Sempre nos acostumamos ao que não devíamos. 
   Eu não deveria ter achado aquela cicatriz no abdômen dele, a coisa mais pura que vi nos últimos tempos. Não sei da sua história, mas me comoveu só de olhar. Sem a audácia, sem o corpo em chamas, ele só um menino. Ele é um homem que não deveria envelhecer nunca. Talvez não nos toquemos mais, porque hoje eu escrevi isso, mas foi natural. Como uma boa atração epidérmica.

06/09/2016

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Por não ser real, eu me perdi na calma do não.

Um ano
50 poemas
Um codinome
Um nome com sete letras
Os olhos
Com o tom de verde mais bonito que já vi
A pessoa que mais me entristeceu
Pérfido inescrupuloso sujo
Um homem comum
Um personagem endeusado
Meu coração cortado à lâmina
O ego dele festeja
enquanto minha dignidade rasteja
Se dor rima com calor
Você poderia me abraçar de novo
Porque vai arder
quando no mesmo segundo
eu lembrar
que você não é meu
Também não sou minha
Sou de Dionísio, mais do que fui sua
Quem é Dionísio? Quem sou eu?

Queima...



(Será que você pode escutar Creep do Radiohead por mim, pela última vez?)




domingo, 21 de agosto de 2016

Meu amado não me amou

                                                                      Não encontrarás um cravo ou 
                                                                      uma rosa, uma flor na minha literatura.
                                                                      Mas encontrarás um punhal ou um fuzil.
                                                                                           Jorge Amado



Todos eles falavam dos meus olhos - tristes
Mas você não teve olhos
Para ver os meus olhos
E eu não conseguia enxergar isso
O deslumbramento me anuvia sempre
Depois do que se sucedeu,
o vermelho daquela esquina
me faz ter vontade de gritar coisas horríveis
Paletas de cores 
de qualquer loja de tintas
Me farão sentir raiva e repulsa
Te vi com olhos de poesia
Porque adensei sua feiura
Me perdi no seu corpo gelado
Por querer escrever versos drummondianos
em sua pele com minha boca quente
Eu congelei
Meu Deus, eu congelei.

11/08

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Nove décimos de mim já morreram, mas eu guardo o décimo restante como uma arma.

   Ninguém se procura, ninguém se cuida. E tristemente, ninguém se entende. Palavras proferidas, silêncios devolvidos. Os danos são atemporais porque as histórias se repetem, se você me magoou foi porque eu deixei, se eu deixei foi porque acreditei que também pudesse me fazer bem. Se eu lhe magoei, peço desculpa. Todas as sensações se embaralham e me exaurem, eu penso tanto no definitivo e na fugacidade. Um homem terno e dolorido, escreveu por mim que, se você pisca quando torna a abrir os olhos, o lindo fica feio. Por isso que a utopia é urgente, quando deito a cabeça no travesseiro e não consigo dormir, é quando sonho com pessoas gentis e uma vida menos ensaiada. 
   Eu preciso dissipar - por meros minutos - a certeza de que ninguém se procura por carinho. E é mais cômodo dizer um "cuide-se" do que cuidar de alguém, porque no fundo não cuidamos  nem de nós mesmos. Estudos nos aconselham a beber mais água, a praticar exercícios e dormir bem. Mas para as pessoas que sentem, dormir bem é piada. E esse excesso de sensibilidade também é um deboche divino. Se escrevo é porque não entendo, mas gostaria. Se escrevo é porque preciso ler  isso tudo mais tarde, e crer que essa exatidão pode muito mais do que agredir. 
    Você certamente já teve momentos como esse, de prestar a atenção nos ruídos do dia acordando, o barulho dos carros, o som dos passos atrasados dos transeuntes. Aliás, gosto muito dessa palavra  "transeunte", pela representação do que nunca cessa, do que nunca para.  Você olhou para o alto? Os pássaros decorando o céu, enquanto eu sinto inveja por ser só isso. Sente as árvores derrubando folhas sobre nossas cabeças cansadas? E essas buzinas e sirenes e cães latindo. Infernal, não é?! Ou é a vida acontecendo em volta enquanto perdemos mais um dia ou ganhamos o mesmo. Eu não me acostumo. Está escutando os carros de propaganda? O arroz mais caro, a festa chata que vai ter no final de semana, mas que iremos para fingir que somos sociáveis e felizes. A música do taxista, enquanto ele limpa seu veículo estacionado, tão piegas quanto os meus pensamentos diários. E aquela mulher que acabou de jogar o papel da bala na calçada? Nojenta. Eu vi. 
   Mas o que somos quando ninguém nos vê? Somos iguais a ela. Somos nojentos só por estarmos respirando. É tudo trágico, meu bem. Mesmo estando na merda, sendo uma merda e vivendo entre uns merdas... Eu preciso sonhar quando coloco minha cabeça no travesseiro.

09/08

Título: Charles Bukowski

domingo, 14 de agosto de 2016

Sutil afago em meus sentidos

Eu perdi as estribeiras, querido
Posso lhe chamar de querido?
Mesmo que soe tão falso 
como sua bondade

Eu pensei em jogar bilhetes 

no seu quintal 
Eu quis pichar a calçada do seu trabalho 
Senti vontade de colar panfletos 
do que te escrevi 
nos postes todos da rua dos Andradas

Mas pessoas como você

não merecem nem a água que bebem
É como se apenas sobrevivessem 
de egocentrismo

Após entender isso, 

escutei músicas horríveis 
só para conseguir chorar de verdade

Eu conheci homens adoráveis, e vis também

Por muito tempo eu me esquivei 
de toques 
de olhares
minuciosos

Depois descobri a delícia

de abraçar quem quer me abraçar
de despir quem quer se desproteger
somente para mim

Mas ainda penso em você

quando lembro de sentimentos arredios
e toques aveludados

Você conseguia elaborar uma réplica de paixão 

embasada num olhar abrasivo
Você me tocou e eu me senti viva.

02/08

Título: Manuel Bandeira

domingo, 7 de agosto de 2016

Au revoir, grande homem pequeno.

Eu vivia na espera dos gestos noturnos
Era só ele encaminhar aquele olhar insano sobre mim
Que eu duvidava da existência dos Deuses
Era só ele dar a entender que me queria
Que eu pegaria meus livros todos e faria uma fogueira
Para aquecer nossos corpos extasiados
De tanta luxúria e desejo
Agora, olhando para o passado-recente
Percebo que eu não mensurava os danos dessa doença
A cura não é absoluta, o vício pode retornar
Quando ele passar por mim na rua
entretido com a paisagem urbana
Me inspirando sem querer mais uma utopia boba
Eu tenho uma fraqueza por belos receptáculos
Os que me fazem crer em divindades
somente por poder admirar perfeitas anatomias
Talvez seja futilidade minha
apreciar mãos bonitas, corpos grandes e robustos
decorados com olhos de atacamita
Mas é por eles que escrevo
e me dispo até a alma
É por eles que me distraio 
só para me destruir.

Meu bem, eu gostei tanto de você até cair
Agora me deu vontade de levantar e gostar de outra pessoa.


20/07/2016

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Só te conheci no bar

   Penso que comecei a escrever sobre você por causa da sensação de impossibilidade que acometia tudo. No decorrer dos meses, quando fui lhe observando melhor, pude ver que você é a pessoa mais acessível do mundo. Então transmutei a errônea sensação, e assassinei um pouco desse encanto. Eu sempre quis algo limpo, quiçá, imaculado. Algo que não tivesse a intenção de quebrar os meus invólucros, nem a minha sensatez.
   Por mais que o sujo me fascine, ele me induz a desejar barbáries, eu morro por dentro quando te penso com outras pessoas... Essa perdição é uma via dupla, quando quero tanto que você me encontre e me enxergue, esbarro no medo de você me ver por aí e eu não estar com o cabelo ajeitado. Sinto taquicardia toda vez que passo perto da rua do seu trabalho, logo depois, sinto remorso por não ter optado por um trajeto mais distante.
   São pequenos acontecimentos banais que fazem eu voltar para casa querendo me apaixonar por alguém que possa também me achar interessante quando estiver sóbrio. Mas isso também é banalidade, eu não escolheria me apaixonar por qualquer pessoa que fosse. A paixão é bonitinha só na primeira semana, o resto do tempo é um constante desespero. Poderia dizer que eu não a desejo a ninguém, mas ela abrange todos. Que crueldade!
  
   Depositei em você a minha vontade de ter alguém mais próximo do personagem que eu não saberei jamais inventar. 

Esse personagem foi você 
na maior parte das vezes 
em que me olhou sem me notar
em que me olhou para me adivinhar 
em que me olhou sem querer me ganhar
em que me olhou para me magoar

Mas você quis ser o que escrevi
para sentir-se mais mundano
Todas que lhe quiseram, conseguiram 
Eu também consegui
Então não há motivos para me entristecer. 

07/07




sexta-feira, 1 de julho de 2016

Porque se você pisca, quando torna a abrir os olhos o lindo ficou feio

Eu sonhei que lhe via
Acordei às 5 da manhã e pensei nisso 
com afinco e estranheza
E no desenrolar do dia
senti que poderíamos nos ver 
a qualquer minuto
Alheios e desatentos pela cidade
Mas foi naquela esquina que se recriou 
meu silencioso espanto
Você no outro lado da rua
Me olhou para me enxergar
Te olhei para inventar
[Mais esse poema]
Me olhou como quem um dia 
comprou um beijo 
Como quem compra um jornal
E senti a tristeza velada de Drummond
Me olhou
Te olhei
Olhou para outro lado
Olhei para o chão
Não nos conhecemos mesmo
Você ter tirado a minha roupa
Eu ter te escrito dezenas de poemas
Jamais nos farão conhecidos
Apesar de eu saber o seu nome há 4 anos
Não, você não se chama Dionísio
E nem tudo o que escrevi foi inventado
Suas descrições por mim salientadas
Te fazem previsível
E de mim pouco seletiva.

25/06


Título: Caio Fernando Abreu

terça-feira, 28 de junho de 2016

Escrevo o poema e iludo-me de que escapei à tristeza

Queria pedir para não deixar
eu te esquecer
Porque escrever sobre você
é melhor do que escrever
sobre qualquer outro
Até lavar roupas num domingo - bonito e ensolarado
de um quase inverno
se torna mais emocionante
Quando penso em você
Apesar de você nunca pensar em mim
E talvez nem me ler mais
Eu esqueceria de sua arrogância
Você poderia continuar
me mantendo nesse estado
de frenesi
Para a caneta dançar
na minha mão
Enquanto eu tento ser feliz
na ilusão de que você é bom
Não apenas bonito o bastante.

19/06

Título: Adélia Prado

domingo, 26 de junho de 2016

Deixa eu confessar essa vileza

Nossos lampejos
de sentimentalidades
não mata a fome mundial
Nossa arte
não conserta a desigualdade
Nem esmaece a corrupção
Nosso senso de justiça
não afaga os oprimidos
Como Leminski,
acho que jamais serei
poeta social
Tudo o que escrevo
é muito confessional e vil.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Eu tenho medo de me desfragmentar enquanto te escrevo

Talvez eu precise de um chá quente
Ou talvez precise que você saiba
agora]
que não consigo dormir
e estou lhe escrevendo esse esboço
Você bem que poderia se revirar na cama
agora]
Sentar por uns minutos,
enquanto meu nome desanuvia
na sua cabeça no escuro do quarto
Tenho a sensação que nunca acontecemos
Todas as imagens foram meramente inventadas
para meu prazer
Já que eu sonhava com você
desde o que parecia impossível
Você não sabe,
mas minha imaginação é perigosíssima
Eu te venero e te destruo
em questão de minutos
Quando você insiste
em passear
na minha cabeça no breu das horas
Você está rodeado de mulheres bonitas
e tão vis quanto sua imagem distorcida
nos espelhos dos banheiros sujos
dos lugares em que se mete
para retocar sua distração
Você se sente mais homem
Quando percebe estar sendo observado
por adolescentes que sustentam uma falsa segurança
em seus saltos altos e batom vermelho
Você tem medo de envelhecer, Dionísio
Medo de perder os olhares
Medo de não ser visto.


21/05

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Para o dono da segunda letra do alfabeto

O menino tatuado e ideológico
Que lê Dickens e Orwell
Talvez ele seja
a minha atração mais autêntica
da cidade
Seu corpo rabiscado com palavras fortes
Não consegue ser mais forte
que minha vontade de toca-lo
Ele é o bloco de notas
de olhar castanho
O mesmo olhar que ontem
parecia me ver sem me enxergar
Escondo minhas pretensões
Porque ele é ao mesmo tempo
tão aberto e arredio
Nos dias que
me contava suas coisas
Me fazia vibrar de euforia
Atuo nesse teatrinho
de ser só mais uma amiga
Quando por dentro
me vejo beijando cada centímetro
de sua pele
O que sinto por ele
esbarra num erotismo intelectual
Que me faz gozar
só de imagina-lo nu
Refletindo sobre a sociedade parca
e corrompida
No mesmo segundo
que percorre os seus dedos em mim.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Eu tinha cada vez mais fome de sua bondade

   Veja bem, não é muito fácil deixar pra lá quando seu pai passa por mim e me cumprimenta. E quando eu distraída te vejo passar numa manhã comum há duas quadras da minha casa. São detalhes e acasos ínfimos que fazem eu acreditar que o destino ri mesmo da minha cara. As coisas que escrevi sobre você nas últimas semanas é o resultado da minha ânsia de delírio. Eu amontoo palavras com o que você me dá, você sempre me dispõe de algo, sem querer... Farelos de devaneios. 
   Não é fácil esquecer quando tenho certeza que sou obcecada desse jeito  por ter a Lua em Escorpião. Ah, meu bem... Quero mesmo lhe esquecer, porque bem nenhum você me faz. Eu tão diplomática estou correndo minhas linhas por alguém que não tem nem respeito por mim. Acho que estou merecendo todo o lodo que vem atravancando o meu caminho. O lodo sou eu. Não é você o problema, não se dê tanta importância. O problema é a minha sensibilidade, não aquela sensibilidade piegas e açucarada. Mas a sensibilidade que deposito no meu olhar sobre todas as coisas que insisto em ver como bonitas. 
   Meu coração apaga o que é feio. Meu coração não vê nada até bater no muro, estilhaçar em caquinhos e fazer clack! Meu som preferido poderia ser o riso de alguém perdido nalguma viela desse país, mas meu som preferido é do meu coração quando faz clack! E isso é tão recorrente.
   Você nunca foi bondoso comigo, por isso garantiu tantos poemas.


Título: Arthur Rimbaud

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Se eu não fosse tão comedida, lhe diria que você me deve um orgasmo

Sinto que
não tenho mais o que escrever
Você usurpou de mim
todas as palavras bonitas

Não consigo admira-lo como outrora
Sinto náuseas de mim mesma
Por ter decaído tanto
Ao enxergar em você algo edificante

Você sujou minha vontade
de permanecer em alguém
Mostrou-me a outra face desse engano

Onde a verdade não liberta
e nem dói
Onde a poesia não remedia
e nem emociona

A urbanidade em sua natureza
coopera para manter-nos longe
Por mais que eu tente procurar
com meus olhos de saudade
seu contorno estático naquela esquina

Eu escrevi várias vezes
que lhe queria mais outra vez
E tive
Mas pela metade, você sabe

Então quero de novo
mais uma vez, para ser a última
Mesmo que isso me fulmine
ou não me cause nada.

terça-feira, 7 de junho de 2016

O poder, a maçã, a sina

Poderia ser mais
do que o frio na barriga
Ao avistar de longe
tal fachada vermelha
Poderia ser menos
do que as suposições - verídicas
feitas por todos
Ah, poderia...
E muito,
se quisesse
Poderia não rasgar
meu coração feito papel
Poderia ir contra toda
a superficialidade
Poderia não ser
meu desejo mais supérfluo
Poderia me entender
Com todas as palavras
ditas escritas e não pronunciadas
Poderia me ler
e me levar para o seu mundo
Mundo utópico
que criei no intuito
de separa-lo do rebanho
Poderia me querer bem
Como um dia dissera que queria
Poderia parar
de chamar a todas
de "querida"
Soa tão falso
E mesmo assim
faz oscilar de raiva
as chamas
do meu secreto inferno
Disse-me tantas coisas
esquecendo a profusão
do estrago
Nunca mensurando
que você também apodreceria
em minhas mãos
Mesmo que eu caísse tão baixo
Claro que caí
Claro que você apodreceu
Você é minha maçã reluzente
e podre no escuro
A mesma que alucinou
Caio e Clarice
Saiba, sinto coisas horrorosas
às vezes]
E me compadeço dos meus
Os meus que
se asfixiaram com o gás de cozinha
Os que
adentraram o rio com pedras nos bolsos
Os que
foram trancafiados por escreverem o amor
em suas diversas formas
As Jaciras
que viveram seus últimos dias
por entre muros brancos
Aos que abraçaram seus cânceres
como poema e não maldição
E escreveram escreveram escreveram
Até aonde a loucura permitiu
No final, todos lustramos
nossas maçãs apodrecidas
Descarta-las, seria não existir
E viver? Viver é outra coisa
Viver não cabe
para quem tem uma caneta entre os dedos.

segunda-feira, 30 de maio de 2016

Tudo o que faço é para sentir o coração disparado

Estou fazendo tudo
o que me instiga vontade
Estou bebendo e dançando
Me esbaldando e beijando
os homens que sempre quis
Estou cobiçando e sendo cobiçada
A luxúria é meu pecado preferido
Meus olhos cintilam 
quando o qualquer mais bonito 
me enxerga com desejo
Esse seu jogo noturno
de todos os finais de semana
Também parece me enaltecer
Estou gostando
de escrever desejos 
com meu batom vermelho 
nas clavículas mais sinuosas da cidade
Não sofro mais sozinha, meu bem
O corpo é meu
A poesia também
Me deixo escrever 
com minhas unhas em costas largas
Qualquer verso que faça 
meu tesão virar rima
Escrevo com a língua 
na pele mais tenra
Uma prece
que faça eu te largar nas lonjuras 
desse encantamento
Hoje eu bebo danço e beijo 
trepo se quiser]
Depois escrevo 
e faço de conta que nada aconteceu
E repito tudo de novo
Vou me dissipar na ilusão 
de que sou capaz de te esquecer
Quando me emaranho 
num outro amontoado de ossos
que disponha de olhos verdes nocivos.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, puro susto e terror

Eu gosto de você, homem
Você pode gostar
de outro homem
Que eu nem ligaria
Talvez você goste mesmo
de alguém
Porque sua vida pueril
não parece ter
significância alguma
Se você anseia por alguém
O tanto que anseio por você
Fomos programados
para doer
Você se dói
nos braços das moças
de pernas bonitas
Eu posso pensar
em me doer mais
nos braços dos homens
de barbas bonitas
No intuito da noite valer a pena
Ou o poema
Você não quer mais
falar comigo
e esse desmazelo perfura
Eu não consigo mais chorar
nem cortando cebolas
Minha incredulidade está
abrangendo meu mundo
Você é o pérfido o sujo o vil
Refletindo melhor
acho que você
Só consegue gostar
de si mesmo
Deve se masturbar
em frente ao espelho
Para concretizar sua devoção
Não sei como vou reagir
quando lhe enxergar por aí
Mas que Deus me ajude
a fazê-lo se sentir
desprezado
Como eu me sinto hoje
De mim você não terá
nem educação
Se eu te avistar na rua
trocarei de calçada
Não me sorria mais
Pois eu já descartei
essa perdição
Gosto mesmo é do que inventei
Apenas peguei
sua imagem emprestada
e estou devolvendo agora.


Título: Adélia Prado

sábado, 21 de maio de 2016

Se te pareço noturna e imperfeita, olha-me de novo. Porque esta noite olhei-me a mim, como se tu me olhasses.

                                                                                                  "Extasiada, fodo contigo
                                                                                                  Ao invés de ganir diante do Nada."


Eu quero beijar sua testa
seus olhos, seu nariz 
suas bochechas, seu queixo
sua boca
Quero beijar 
cada pedacinho da sua face
Eu quero segurar seu rosto 
entre minhas mãos pequenas 
e vivenciar esse momento 
no dedilhar sob sua pele
Eu vou assassinar seu olhar
mecanizado sobre todas as coisas
Para que possas me ver
sendo mais que uma mulher enfezada
De poucos atrativos 
Perpetue em mim a comoção de ser vista
Tal como sou
e o nosso acaso esconde
Não me cortes
com suas vontades inomináveis
E seu erotismo destilado em álcool
Tu és eterno a partir de agora
Ninguém te descreverá como eu

Título: Hilda Hilst

11/05/2016

sábado, 14 de maio de 2016

Pedras, flores, abraços, acenos. Me roube. - uma letra no lugar certo mudaria tudo, um gesto também

Você quer mesmo ser 
mais um dos homens 
que escarraram no meu coração?

Estou sedenta por inspiração
Se você se desfazer de mim mais uma vez
pode ser que eu cultive um jardim
Noutrora, apedrejaria sua casa

Você prefere as putas ou as santas?
Transito entre as duas divindades
Posso me transfigurar no que quiser
Se eu ainda lhe quiser

Ah, minha alva criatura
Por que me põe tanto desatino?
Parece que pensa em mim no meio da noite
Porque acordo nas horas cinzas
e sinto vontade de sair para caminhar

Deixa-me descortinar suas cores
Mais à frente da brancura da sua tez
e seus olhos verdejantes
Deixa-me tê-lo 
na delicadeza e fúria que sou capaz

Não queira vagar sorrateiro por aí
apenas por saber que em mim tem guarida
Naquela noite, eu disse não estar apaixonada
Mas na noite de hoje, não sei mais

Sei que me quer bem
mesmo que não mais me queira
Queria que hoje você dormisse bem
Mas hoje você não dorme, hoje você é da Noite
Que ela lhe cuide então.

domingo, 8 de maio de 2016

Me afaga com mãos de papel, como se fosse impossível me escrever sem me tocar

   Você se afogou nas águas do Laranjal, nas mesmas águas que estraguei meus fones de ouvido naquele dezembro gelado de alguns anos atrás. Você pisou com os pés firmes descalços na areia, e vislumbrou a profundidade abraçando seu corpo esguio de 1,90 de altura. Você não quis ser só o estudante de psicologia com as pernas tatuadas e que me inspirava poesia apesar da distância geográfica, você queria desaparecer, de Pelotas, do mapa, dos poemas, do meu coração. Porque você não era obrigado a nada. Mas você gostava de ser escrito por mim, como eu amei ter escrito você. Eu queria desaparecer, de Alegrete, do mapa, esquecer dos poemas e mastigar meu coração. Você ainda tem aquele bilhete que lhe deixei na biblioteca? Que eu dizia não ter mais tempo para ficar planejando desfechos para um único personagem, pois existem tantas pessoas lá fora que renderiam bons sonetos... Mas você, você me inspirou um livro todo. E eu passei a ter medo de mim. 
   Te escrevi mais de cem poemas, nos perdemos no meio deles. Você se afogou só pra saber se era de verdade. Um rapaz frustrado que fumava maconha todo o dia enquanto lia Foucault, Jung, Nietzsche, Freud e conversava com uma moça perturbada que só sabia falar sobre escritores malditos. Hoje você é um psicólogo, tenho certeza que ainda frustrado.    
Eu continuo sendo a mesma moça escrevendo sobre caras estranhos que jamais serão você, meu João.

Título:  Dançando na sarjeta (link- poema para joão)

quinta-feira, 5 de maio de 2016

Na minha cabeça eu ainda não cansei de você

Estamos deitados 
sem roupas
Escutando Billie Holiday 
Na minha cabeça

Enquanto você ri 
da loucura boa 
que é estarmos juntos

Eu lhe conto como foi 
a primeira vez que lhe vi
E a partir de quando
comecei a me sentir inquieta
quando você me via
Sem saber quem eu era

Na minha cabeça
você até já acendeu um beck
Logo após eu ter queimado inteira

Seguimos falando sobre coisas difusas
E eu tento em vão
não parecer confusa
Mascaro o quão esquisita posso ser
Quando me dedico a uma nova atração

Se eu lhe tornasse ciente
do quanto te adoro
você me lançaria à realidade
E Buk, sabia que,
tudo o que é belo 
queima com a primeira luz de realidade

Na minha cabeça
Eu lhe compreendo
com sua boêmia 
Com sua malandragem poética 

E sei que por detrás 
dos seus tons noturnos
Existe o homem só
Que não é feliz e nem triste
Mas que vive de exterioridade
harmonizando um copo na mão

Na minha cabeça
Você é sempre gentil
E educado por instinto
Ainda mais comigo
que lhe bordei um tapete de palavras

Na minha cabeça
Você supera o bêbado vulgar
com codinome mitológico 

Só na minha cabeça, 
você consegue ser mais.