quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Para ler escutando The Cranberries - Linger

todas as coisas que vivemos 
eu já escrevi
não faltou tempo
faltou vontade
agora eu tenho que revirar minha mente
em busca de detalhes seus
que não morrem em dias quentes
o clichê de gostar tanto pra tão pouco
a noite que você foi me buscar na faculdade
eu quis tanto que se repetisse
como se fosse natural
como se as minhas pernas fossem
o lugar favorito das suas mãos enquanto você dirige
mas sempre existiu outras pernas
as pessoas me alertaram
sua baixeza era evidente
poesia alguma o salvaria
mas essa aura me arrastava até a sua porta
toda vez que eu precisei de paixão
hoje você é um prurido na minha pele
me faz tão mal
sempre volta a me perturbar.


Arte: Tina Maria Elena





quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

A esperança é uma droga alucinógena.

por tanto tempo 
esperei um gesto
algo que adiasse 
a degradação
se a minha existência
lhe tocasse
se a minha presença
no outro lado da rua
lhe tirasse o sono à noite
se tudo fosse diferente
essa história não seria minha
acho que já escrevi 
um poema assim
mas nunca doeu assim
a dor se aperfeiçoa
não é mesmo?
e eu estou sempre
me repetindo
mas bastaria um gesto seu
para cessar a corrosão.

Título: Rubem Alves

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

O amor que não dá certo sempre está por perto.

   Aquele ar saudosista está pairando por aqui, agora consigo notar as rachaduras dos velhos sobrados da avenida mais movimentada, a sensação é confusa. Mesmo assim, não pertenço a esse lugar. Mesmo se você tivesse me abraçado dentro do meu bar preferido, mesmo se você gostasse de mim... Eu teria que ir embora. Mas ao menos iria sabendo que morei no seu peito. Hoje lembrei da noite que limpei as lentes dos seus óculos com o lenço dos meus, e você me olhou com afeto. Sem imaginar que eu poderia fazer muito mais se você deixasse. Na verdade nunca irei esquecer de todas as pequenezas que constituíram os nossos momentos, mesmo que logo ali na frente você esqueça o meu nome. Até esse minuto presente posso dizer que ninguém me dilacerou dessa maneira, mas o meu coração partido eu sempre colei com poesia. E será sempre desse jeito. Mesmo que o seu jeito me assombre e me rompa em  diminutas partículas de açúcar. Você se desfez tanto de mim, não consegui escrever durante esses três meses, eu precisei desse tempo para sentir isso, sentir meu corpo se desfragmentando naquele evento abarrotado de gente onde outras mãos seguravam as suas mãos no centro da cidade, para todos verem. É compreensível a dor. Meus pés na água fria de Copacabana não esfriou a sua imagem na minha cabeça. Seu nome no meu celular após tudo isso, sua precisão epidérmica de mim espezinha minha crença em grandes pertencimentos. Você me procurou só para comprovar que essa minha paixão é mais elevada que o morro do Corcovado. Eu vou ir embora e você nem sabe, se soubesse não se afligiria pois seria desimportante não me ver nunca mais. Preciso ir, sobretudo para me conhecer e me amar. Para nunca mais gostar de quem me esconde, de quem diz que não pode me ver mais vezes, de quem numa noite me queima no colchão e me esquece no outro dia. Vou ir embora porque nunca mais quero sentir isso.


Título: Cacaso, no livro "Lero-lero".